terça-feira, 22 de outubro de 2013

Juiz divulga Ofício enviado à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania

Ofício nº       /2013
Canindé (CE), 30 de abril de 2013



À Sua excelência a Senhora
Mariana Lobo Botelho Albuquerque
Secretária de Estado da Justiça e Cidadania
Secretaria Estadual da Justiça e Cidadania
Fortaleza - Ceará


Senhora Secretária,

Segundo as disposições insertas na Lei nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal):

1. os estabelecimentos penais são classificados conforme a sua natureza e destinam-se ao condenado, ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso, (arts. 82 e 83);

2. o preso provisório ficará separado do condenado por sentença transitada em julgado, e o estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade, (arts. 84 e 85); 

3. a penitenciária destina-se ao condenado à pena de reclusão em regime fechado, e será construída em local afastado do centro urbano à distancia que não restrinja a visitação, (arts. 87 e 90);

4. a cadeia pública destina-se ao recolhimento de presos provisórios. Cada comarca terá, pelo menos 1 (uma) cadeia pública a fim de resguardar o interesse da Administração da Justiça Criminal e a permanência do preso em local próximo ao seu meio social e familiar. O estabelecimento de que trata este Capítulo será instalado próximo de centro urbano, observando-se na construção as exigências mínimas referidas no artigo 88 e seu Parágrafo Único desta Lei, (arts. 102, 103 e 104). 

Mesmo sabendo que Vossa Excelência e sua valorosa equipe de assessores têm conhecimento dos dispositivos legais antes nominados e que dominam com percuciência os temas relacionados com a politica penitenciária, ouso afirmar, sem muito esforço, que a Comarca de Canindé está isolada das ações institucionais dessa Secretaria, que estampa no seu site eletrônico a missão de promover o pleno exercício da cidadania e a defesa dos direitos humanos inalienáveis da pessoa humana.

Numa simples e rápida visita na Cadeia Pública desta Comarca, até mesmo um leigo constata que a “defesa dos direitos humanos inalienáveis da pessoa humana” não passa de uma bonita frase de efeito, uma vez que se depara com seres humanos amontoados em celas inadequadas e insalubres, sujeitos e expostos a todo tipo de doenças infecto-contagiosas, tendo em vista a superlotação das celas, com internos que dormem praticamente uns em cima dos outros.    

Ora, segundo o art. 102 da Lei nº 7.210/84, a Cadeia Pública se destina ao recolhimento dos presos provisórios, sendo que os condenados com sentença transitada em julgado o mandamento legal em referência determina que sejam recolhidos nas penitenciárias. A inobservância dos preceitos legais invocados  provoca a superlotação, sem falar no descumprimento da disposição que determina a separação dos presos provisórios dos condenados.

No próprio site da Secretaria Estadual da Justiça e Cidadania encontra-se a informação de que a Cadeia Pública de Canindé tem capacidade para abrigar de 20 (vinte) presos, talvez na data da sua inauguração, há vários anos atras, uma vez que na atualidade esta capacidade está totalmente fora da realidade tendo em vista que hoje abriga mais de 50 (cincoenta) presos, encarcerados em cinco celas, sendo que deste total 25 (vinte e cinco) são condenados, alguns com penas elevadas.

A propósito da errônea e equivocada interpretação do enunciado que determina a permanência do preso em local próximo ao seu meio social e familiar, como forma de receber assistência material da família, argumento utilizado para manter o preso condenado nas Cadeias Públicas, com fundamento no art. 103 da Lei nº 7.210/84, o referido comando legal destina-se aos presos provisórios, até porque a assistência material ao preso condenado deve ser garantida pelo Estado nas penitenciárias, estabelecimento que lhes é destinado por imposição legal, (art. 87).

Na condição de juiz titular da 1ª Vara desta Comarca desde 2001, ao longo dos anos, isoladamente ou com o apoio do Ministério Público apresentei varias exposições de motivos, encaminhei vários ofícios, mantive conversas e entendimentos com Secretários da Justiça e Cidadania no sentido desta Comarca ser contemplada com a implantação de um nova Cadeia Pública condizente com a realidade desta unidade judiciária, e acima de tudo capaz de permitir o encarceramento do preso com um minimo de respeito a sua condição pessoal e aos direitos humanos.

Mas hoje, depois de muitas promessas e reformas paliativas e cosméticas no prédio da Cadeia Pública constato que todo este esforço não foi suficiente para sensibilizar a gestão penitenciária do Estado, talvez porque falta o envolvimento da classe politica e neste aspecto devo reconhecer que este Município deixa muito a desejar, pois não vejo qualquer iniciativa no sentido de priorizar esta questão nos planos de Governo. Talvez também seja por isso, a falta do peso politico, que outras cidades, muito menores e com demanda prisional inexpressiva, tenham conseguido a implantação de um estabelecimento penal moderno e adequado.

Por outro lado, o excesso de presos na Cadeia Pública impede o recebimento de presos da Delegacia de Policia, resultando numa situação insustentável, uma vez que hoje estão recolhidos mais de trinta presos na repartição policial, inclusive condenados, ressaltando que a estrutura física das celas é precária transformando-se em verdadeiras masmorras, uma vez que apresentam infiltrações, são insalubres, sem qualquer tipo de areação, escuras e exalam mal cheiro insuportável. Os mesmos apelos foram feitos ao longo dos anos para a Secretaria de Segurança Pública no sentido de reformar a estrutura física da Delegacia de Policia, entretanto, outras cidades de menor porte foram contempladas com repartições policiais novas ou reformadas, mas Canindé foi esquecida, talvez pelos mesmos motivos que impedem a implantação de uma Cadeia Pública nova.

Por outro lado, nem mesmo a interdição das celas da Delegacia de Policia e da Cadeia Pública foi suficiente para sensibilizar o Governo estadual, entretanto, a situação atual está reclamando uma providencia urgente, uma vez que sucessivos expedientes do Delegado de Policia informam que a repartição policial não tem mais condições de receber presos, comprometendo ate mesmo a lavratura dos flagrantes, tendo em vista que a Cadeia Pública também está lotada e não tem condições de absorver a quantidade de presos provisórios atualmente recolhidos nas celas da Delegacia de Policia, o que poderia ser minorado com a transferência dos presos condenados para estabelecimentos penais adequados e conforme preconiza a lei.

Desta forma, solicito a Vossa Excelência que adote, com urgência, as providencias necessárias no sentido de transferir os presos condenados que estão recolhidos na Cadeia Pública desta Comarca para estabelecimentos penais adequados, com fundamento no art. 87 da Lei nº 7.210/84, sob pena da adoção de providencias judiciais no sentido de fazer cumprir as disposições da Constituição Federal e da Lei de Execução Penal no que respeita  a garantia da dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais dos encarcerados.

Atenciosamente,



Bel. Antonio Josimar Almeida Alves
Juiz de Direito – 1ª Vara
  

     



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