segunda-feira, 24 de junho de 2013

Juiz baixa portaria que proíbe a entrada de novos presos na Cadeia Pública de Canindé

Prezados comunicadores,

Estou encaminhando em anexo cópia da Portaria que proíbe a entrada de novos presos na Cadeia Pública de Canindé, com vigência a partir de hoje, 24.06.2013, tendo em vista a noticia de que a Secretaria de Segurança Pública e a Secretaria de Justiça estariam pretendendo resolver o problema da interdição das celas da Delegacia de Policia enviando os presos flagranteados para a Cadeia Pública, unilateralmente e sem ouvir previamente o juiz da execução penal, Isto e, simplesmente transferindo o problema para a Cadeia Pública, fato que poderá deteriorizar ainda mais as precárias condições do estabelecimento penal local, inclusive gerar insatisfação nos internos que lá estão recolhidos em face do agravamento do excesso de presos nas celas. Inadmissível! 

Segue também em anexo um Ofício que encaminhei para o Diretor da Cadeia Pública proibindo a entrada de novos presos, mas segundo o Diretor do estabelecimento penal, a SEJUS ao tomar conhecimento do Ofício, informou para ele que o expediente em referência não iria impedir a entrada de novos presos na Cadeia Pública, isto é, não teria qualquer validade, por isso editei a Portaria em regime de urgência, ate para saber ate onde vai a audácia do Governo do Estado.  

Parece que estou sozinho nesta luta!!!

Infelizmente, ao invés de adotar ações para resolver o problema da Delegacia de Policia, o Estado mais uma vez demonstra todo o seu desapreço com a esta Cidade e com o seu Povo, querendo simplesmente "empurrar" mais presos para a Cadeia Pública. Se isto acontecer a Cadeia Pública pode se transformar num "barril de pólvora". Será que as autoridades locais não têm sensibilidade para este problema? Será que esta situação é um problema somente dos presos e de suas famílias? O Poder Judiciário está fazendo o seu papel, cumprindo sua missão, tentando fazer cumprir a lei, entretanto, é necessária a mobilização das autoridades locais. Se algo mais grave acontecer, quem poderá ser responsabilizado, além do próprio Estado? Aqui não é terra de ninguém ou "casa da mãe joana"! Mais uma vez conclamo as autoridades locais para o engajamento no enfrentamento do problema. No site da Secretaria de Justiça está anunciada a inauguração de uma Cadeia Pública no município de Jati, mas para Canindé o Governo do Estado simplesmente quer transferir os presos da Delegacia de Policia para a Cadeia Pública, como se o estabelecimento penal suportasse a entrada de mais presos, e sem se importar com as consequências. Até quando este caos na segurança pública de Canindé (Delegacia de Policia e Cadeia Pública) vai continuar? Porque segurança pública aqui não é prioridade? Com a palavra as autoridades públicas locais, não para  fazer ou programar outras reuniões para discutir o problema, mas para efetivamente firmar uma posição e representar de fato e de direito aqueles que detêm verdadeiramente o Poder.          

Grato pelo apoio,

Bel. Antonio Josimar Almeida Alves
Juiz de Direito - 1ª Vara 

 Ementa: Dispõe sobre a proibição da entrada de novos presos na Cadeia Pública da Comarca de Canindé, Estado do Ceará, e determina outras providencias.


O Bel. Antonio Josimar Almeida Alves, Juiz de Direito Titular da 1ª Vara da Comarca de Canindé, Estado do Ceará, na forma das disposições do artigo 66, inciso VIII, da Lei n° 7.210/84, e da Resolução n° 47/07 do Conselho Nacional de Justiça...

CONSIDERANDO que compete ao juiz interditar, no todo ou em parte, estabelecimento penal que estiver funcionando em condições inadequadas ou com inobservância aos dispositivos da Lei de Execução Penal (artigo 66, inciso VIII da Lei Federal n° 7.210/84);

CONSIDERANDO que, conforme dispõe o artigo 1º da Resolução 47 do Conselho Nacional de Justiça, devem os juízes da execução criminal tomar providências para o adequado funcionamento dos estabelecimentos penais sob sua responsabilidade, promovendo, quando for o caso, a apuração de responsabilidade;

CONSIDERANDO o disposto no artigo 88 e no seu Parágrafo Único, da Lei Federal n° 7.210/84, determinando que o O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório, sendo “requisitos básicos da unidade celular: a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana; e b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).”

CONSIDERANDO as disposições expressas nos artigos 102, 103 e 104 da Lei Federal n° 7.210/84, impondo que “A cadeia pública destina-se ao recolhimento de presos provisórios, e que em “Cada comarca terá, pelo menos 1 (uma) cadeia pública a fim de resguardar o interesse da Administração da Justiça Criminal e a permanência do preso em local próximo ao seu meio social e familiar”, sendo que o estabelecimento penal em referência “será instalado próximo de centro urbano, observando-se na construção as exigências mínimas referidas no artigo 88 e seu parágrafo único desta Lei.


CONSIDERANDO que, conforme o art. 42 da Lei de Execução Penal (Lei Federal n° 7.210/84) aplica-se ao preso provisório e ao submetido à medida de segurança o disposto aos direitos inerentes aos presos definitivos;

CONSIDERANDO que a Cadeia Pública da Comarca de Canindé/CE., tem capacidade máxima projetada para 30 (trinta) custodiados, levando em consideração que as 5 (cinco) celas masculinas existentes foram concebidas para abrigar 6 (seis) presos;

CONSIDERANDO as ultimas informações prestadas a este Juízo pela Direção da Cadeia Pública de Canindé/CE., no sentido de que aquele estabelecimento abriga hoje 50 (cinqüenta) pessoas presas, com uma quantidade expressiva de presos condenados, quase 30 (trinta) internos;

CONSIDERANDO que o número de Agentes Penitenciários diário é de apenas 1(um), quantidade ínfima e insuficiente para atender a demanda do presídio, sem mencionar as condições de segurança, que são absurdamente frágeis, especialmente nos dias de visitação, uma vez que a quantidade de policiais militares guarnecendo a área externa igualmente é insuficiente, sendo que não raramente apenas dois militares cumprem escala no estabelecimento penal;

CONSIDERANDO a fragilidade das condições de segurança, e a ausência de condições mínimas e dignas de recolhimento dos internos, vários incidentes eclodiram no ambiente prisional, inclusive com o registro de lesões e ameaças entre os internos, situação preocupante, pois o caminho para conseguir uma transferência a bem da ordem e da disciplina é longo e burocrático;

CONSIDERANDO que também é incontroversa a ausência de enfermaria e de assistência social, a indisponibilidade de atividade laborativa, inexistência de ambulatório médico, de atendentes de enfermagem, de médicos, de psicólogos e dentistas, sendo ainda incontroverso o não fornecimento de medicamentos por parte do Estado, sendo necessária colaboração dos familiares, ou a atuação do Juiz da Execução Penal para minimizar os efeitos da omissão e da inércia estatais, mediante solicitações ao Poder Público municipal, que a rigor não tem a obrigação legal de suprir estas carências;

CONSIDERANDO que foram expedidos vários expedientes à Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania, sem que medidas efetivas tivessem sido adotadas até o momento, com exceção de uma reforma paliativa realizada no estabelecimento penal local, que teve como conquistas importantes, a criação de uma cela feminina, de uma sala de aula e de mais uma cela masculina, sendo importante salientar que a reforma realizada na área do recolhimento dos presos em regime semi aberto e aberto transformou o local num inferno, tendo em vista a alta temperatura decorrente da ausência de circulação de ventilação natural;

CONSIDERANDO a lição doutrinária de Guilherme de Souza Nucci, que comentando o artigo 102 da Lei de Execução Penal (Lei Federal n° 7.210/84) ensina que “Dentro da cadeia pública, não há trabalho disponível, nem outras dependências de lazer, cursos etc., justamente por ser lugar de passagem, onde não se deve cumprir pena (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 4ª ed. Revista dos Tribunais. São Paulo, pág. 519). Grifei.

  CONSIDERANDO também o comentário de José Afonso da Silva, sobre o direito do preso à integridade física e moral, para quem “as prisões, especialmente as cadeias públicas e os cárceres de delegacias distritais, estão superlotadas, inclusive de presos condenados. Vivem eles, ali, em condições desumanas e degradantes, muitas vezes sem insolação, sem o mínimo de conforto, às vezes dependurados nas grades, por meio de lençóis, para dormir, por falta de espaço onde possam recostar decentemente. Ora, a norma em comento nada mais é que a contra face positiva daquela norma negativa, aplicada a um destinatário específico: o preso. Aqui a determinação é no sentido de respeito à integridade física e moral do preso. Aquela tem sentido geral: vedam-se a tortura e tratamento desumano e degradante a qualquer pessoa, seja preso ou não. Esta tem destinatário específico: o preso” (Comentário Contextual à Constituição, Malheiros, 3ª edição, pág. 151).

CONSIDERANDO que as regras de confinamento têm por fundamento o próprio escopo da execução penal, estabelecido no artigo 1º da Lei Federal nº 7.210/84: “Art. 1º: A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”, e que de fato, a harmônica integração social do condenado e do internado tem como fonte real de suporte a dignidade da pessoa humana, valor de afirmação histórica e que corresponde a um preceito oriundo do cristianismo  , positivado como princípio fundamental da República Federativa do Brasil;

CONSIDERANDO que é incontroversa a necessidade de reestruturação do sistema carcerário da Comarca de Canindé/CE., pois o   estabelecimento penal expõe os internos a risco de morte e compromete a integridade física de todos pela superlotação, a tratamento desumano, tornando absolutamente cruel o cumprimento das penas;

CONSIDERANDO o discurso estatal de que as políticas públicas são realizadas de acordo com a viabilidade de condições;

CONSIDERANDO que não é pelo fato de os reclusos estarem cumprindo pena que se permite ao Estado desrespeitar seus direitos básicos como pessoa humana;

CONSIDERANDO as condições desumanas a que estão se submetendo os presos desta Cidade, seja nas celas da Delegacia de Policia, seja nas celas da Cadeia Pública, inegável de que há clara violação aos princípios referidos acima, a dignidade da pessoa humana e a segurança pública, sem falar que compromete a recuperação harmônica do preso, colocando-o em situação subumana, algo que não orienta os valores nem da dignidade da pessoa humana, nem da própria segurança pública.

CONSIDERANDO que a restrição da liberdade não pode representar restrição à humanidade;

CONSIDERANDO a necessidade de que se cumpra a Lei de Execução Penal no que respeita as suas previsões quanto à salubridade do ambiente carcerário, salientando-se que o cumprimento de lei é matéria que não pode deixar de ser apreciada pelo Poder Judiciário, ainda mais por não ser matéria discricionária do Poder Executivo;

CONSIDERANDO a necessidade de limitar o numero máximo de presos recolhidos no estabelecimento penal, embora a capacidade esteja esgotada;

CONSIDERANDO que a limitação pretendida trata-se de mero controle de aplicação da lei, e que a administração está obrigada a atender os padrões mínimos de segurança e salubridade do estabelecimento penal, sendo dever do Estado de promover a segurança pública, nos termos do artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, que garante aos presos respeito à integridade física e moral.

R E S O L V E:

Art. 1º - Proibir o ingresso de novos custodiados na Cadeia Pública de Canindé/CE., sejam provisórios ou condenados, até que o número de internos seja reduzido à capacidade máxima projetada do estabelecimento penal, devendo os novos presos serem remanejados para outros estabelecimentos penais integrantes do Sistema Penitenciário Estadual.

Art. 2º - Fixo prazo de 30(trinta) dias para que a Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado do Ceará apresente a este Juízo proposta circunstanciada de adequação da lotação de internos e do efetivo de agentes penitenciários da Cadeia Pública de Canindé/CE.

Art. 3° - Determinar que Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado do Ceará remova os sentenciados que se encontram na Cadeia Pública de Canindé/CE., e já possuam condenação transitada em julgado, para estabelecimentos penais adequados, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, a contar do conhecimento desta Portaria, sob pena de multa cominatória diária no valor de R$5.000 (cinco mil reais)

Art. 4° - Proibir a permanência de sentenciados na Cadeia Pública de Canindé/CE., que possuam condenação transitada em julgado, por mais de 30 (trinta) dias, a contar da data do recolhimento, sob pena de multa cominatória diária no valor de R$5.000 (cinco mil reais).

Art. 5º - Afixe-se cópia desta Portaria no átrio do Fórum local e encaminhem-se cópias à Corregedoria Geral de Justiça, ao Ministério Público, Defensoria Pública, O.A.B./CE., à Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania, à Delegacia Regional de Policia Civil de Canindé e à Cadeia Pública de Canindé/CE., publicando-a do Diário da Justiça Eletrônico.

Art. 6º - Esta Portaria entrará em vigor em 24 de junho de 2013.

Publique-se. Registre-se. Cumpra-se.

Canindé (CE), aos 21 (vinte e um) dias do mês de junho de 2013.

Bel. Antonio Josimar Almeida Alves
Juiz de Direito Titular da 1ª Vara de Canindé/CE.

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